Candomblé X Violência. Até Quando?
Violência dentro de Terreiro
Este post surgiu após um triste encontro que tive. Na verdade o assunto seria outro, bem mais alegre e produtivo. Mas, estava eu passando próximo a uma delegacia que tem aos redores de minha residência, quando vejo sair de lá uma menina semi paramentada de Ìyemojá. Tomei um susto e curioso, pensei se tratar de um caso de intolerância religiosa e fui falar com a mesma, que até mesmo aparentava ser menor.
Era uma Ìyáwo de Ìyémojá com seus 19 anos e marcas diversas pelo corpo e rosto. Confidenciou-me que foi agredida pela zeladora e por um ògá de sua casa de santo. Segundo um irmão de santo que estava com ela na delegacia, tudo começou durante um treino de dança.
A zeladora ensinava Ìyá uns passos, porém não estava satisfeita com a evolução e se utilizava de uma chibata para bater nos pés do Òrìsà. O ògá que estava encarregado dos toques ria e debochava da situação. Em determinado momento Ìyemojá repreendeu o rapaz que tocava e a zeladora tomando as dores, começou a agredir todo o corpo da menina virada e depois deu a chibata para que ìyémojá se auto agredisse (costume triste que há em alguns terreiros).
Neste momento o òrìsà se recusou e começaram as agressões mais fortes, com tapas e empurrões. A menina acordou e disse que tentou se desvencilhar das agressões quando o rapaz também partiu pra cima tentando segurá-la pra que a zeladora batesse nela. Depois de muita luta, ela conseguiu sair correndo do barracão. Pegou um táxi e chegou até a delegacia.
Um Triste Costume em Alguns Candomblés
Alguns alunos a tempos atrás já me relataram esse tipo de situação onde a zeladora ou zelador entrega para o òrìsà um chicote, colher de pau ou vara para que diante de algo que o filho tenha feito de errado, o òrìsà corrija através das agressões. Não é algo novo isso, infelizmente. Gritos, xingamentos e ofensas são até naturais de se ouvir dentro de uma barracão, sendo que a vítima nunca pode responder.
Recentemente uma pessoa no Facebook fez uma postagem com esta indagação, se era correto isso e penso eu que isso é resquício de uma época feia que tivemos em nossa sociedade que foi a escravidão. Para quem não sabe, algumas zeladoras eram endinheiradas, donas de comércios e compravam a alforria de alguns escravos, tendo esse depois a possibilidade de ir pagando aos poucos. Mas ele ficava ligado a casa de santo, que era considerada a “pequena África” e ali muita coisa sofria.
Mas hoje, não há (não que houvesse naquela época) qualquer necessidade desse tipo de agressão. Tendo eu já visto casos em que o próprio filho processou o pai de santo.
Alguns zeladores e zeladoras tem um estranho costume de se achar dono de seu filho, do iniciado. Muitas vezes querendo interferir até mesmo em suas relações, emprego e família. Tudo isso disfarçado de ajuda. Ainda temos o regime de quase escravidão que alguns passam quando são ajudado pelos zeladores, isso quando o zelador assume os custos de alguma obrigação que o Ìyáwo precise.
O Que a Lei Diz?
Muitos atos ocorridos dentro de uma barracão podem ter configuração de crime. Temos lesão corporal (Art. 129) e lesão verbal (injúria – Crime contra a Honra – Art. 140). O crime de lesão corporal no Direito Penal Brasileiro está presente no artigo 129 e em seus parágrafos, tendo diversos níveis.
Lesão corporal – é resultado de atentado bem sucedido à integridade corporal ou a saúde do ser humano, excluído o próprio autor da lesão. O crime pode ser praticado por ação ou omissão.
Ofensa à integridade física pode dizer respeito à debilitação da saúde como todo ou do funcionamento de algum órgão ou sistema do corpo humano, inclusive se o resultado for o agravamento de circunstância previamente existente. Também pode ser qualquer alteração anatômica que não tenha expressa autorização da pessoa que vai sofrer a alteração, que vão desde tatuagens a amputações, passando por todas as alterações físicas provocadas pela ação ou omissão maliciosa de outrem, que pode ter utilizado meios diretos ou indiretos para gerar o dano.
Para caracterizar a lesão corporal é necessário que esteja configurada a alteração física (A menina tinha hematomas, arranhões, etc), mesmo que apenas temporária, sendo que sensações como desconforto ou dor física não são consideradas como formas de lesão corporal.(Fonte: Wikipedia)
Injúria ou Crime contra a Honra – O capítulo do Código Penal Brasileiro que trata dos Crimes contra a honra trata dos crimes que atentam contra a honra subjetiva ou a honra objetiva, seja ofensa a dignidade pessoal ou a fama profissional, retirando do indivíduo seu direito ao respeito pessoal. Neste capítulo estão tipificadas a calúnia, a difamação e a injúria.
São crimes cometidos utilizando qualquer meio de comunicação que faça transmitir uma ofensa, entre os quais podemos citar a televisão, a internet, o telefone, a ofensa feita diretamente. Igualmente pode a agressão ser feita por palavras, gestos, barulhos (como a imitação de animais) etc.(Fonte: Wikipedia)
Respeito em Todos os Níveis e Hierarquia
Uma coisa que sempre ouço do Candomblé e concordo é o nível de disciplina e respeito que se aprende lá dentro nas práticas religiosas. Mas cada dia mais vejo que algumas pessoas restringem seu respeito ao Òrìsà que não vê, e qualquer outra coisa sem ser isso não se tem respeito. Alguns nem mesmo com o lado espiritual do Òrìsà.
Tem o pessoal da cobrança, que acha que um dia haverá uma cobrança por parte do Òrìsà. Será? Pode ser, mas antes disso, muita coisa errada acaba acontecendo e pessoas sofrem. Denunciem. Não aceitem esse tipo de prática no Candomblé. Procure uma delegacia mais próxima e vamos fazer barulho.
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Infelizmente é por causa deste tipo de coisa que muitos filhos de santo se convertem para as religiões neopentecostais e dizem que candomblé é coisa do diabo. Que a Iemojá desta iawô agredida faça justiça por sua filha espancada
Mo júbà
Pois, às vezes nem a justiça dos homens adianta. Muito obrigado por seu comentário.
Mo júbà. Lamento tecer este comentário mas assim é o que penso. O homem branco seguindo a evolução dos tempo e as novas leis, libertou o negro e consequentemente muitos do povo de santo, porém, sem generalizar, muitos do povo de santo (no popular) se acham semi-deuses e agora escravizam até mesmo o Òrìsà. Essa prática se deve muito ao financeiro porque essas pessoas buscam resultado, precisam mostrar a sociedade uma entidade perfeita, domesticada, coreograficamente um exímio bailarino.
Por ai….
Isso eu nunca vi, olha q eu tenho 21 anos que frequento eu já vi o boiadeiro com chicote e ele mesmo se chicoteando sem deixar marca.
No meu terreiro a mãe de santo bate nos filhos de santo só quando ela percebe q está de fingimento Mas ela não bate na frente dos outros.
Mo júbà
Grato pelo seu comentário. Mas lembrando que independente de fingimento ou de não ser na frente de outras pessoas, ninguém tem o direito de agredir ninguém, configurando crime de agressão.
Grande abraço
Oluko Vander
Concordo com suas palavras. Tenho muito que aprender pq amo orixa, mas morro de medo dos pais e maes de santo, que tem essa atitude. Axé.
Mo júbà… grato pelo apoio!!
O grande enfrentamento da maioria das casas e de seus mebro é confundirem hierarquia com desrespeito, tenho 40 anos de feito e sempre respeitei a todos. Vivemos numa sociedade onde se cultua orixás, e , no meu entendimento meu orixá, pelo fato de ter 40 anos de feito, não será melhor do que o mesmo orixá que acabou de nascer num yaô. A hierarquia serve para organização de uma sociedade já o desrespeito só gera isso ai, desunião, desistência e troca de religião, muito triste isso. Já não se respeita mais o orixá como antigamente, por essa razão a religião não é respeitada nem vista com o valor que realmente tem, pois onde não há união, não pode haver justiça, falta fé, falta humildade e principalmente amor ao orixá. É o que acho. Boa noite1
Mo júbà
Pois é, por estas e tantas outras atitudes de alguns adeptos, nossa religião está perdendo força e respeito.
Grato pelo comentário.
O dábò
Já vi isso acontecer
Uma yalorixa agredia seus filhos de santo se fingindo estar incorporada com caboclo que batia com chicote .e quando estava com raiva por um erro dos filhos de santo agredia com tapas e socos e um abuso de poder
Mais uma filha de santo depois de ser agredida na rua com sua filha no colo ela processou a yalorixa ao qual teve que pagar várias. Cestas bassicas tem que denunciar sim
Infelizmente a ascensão a um determinado cargo ou posto, dentro da nossa religião é uma questão de hierarquia. Pessoas não bem resolvidas na vida (seja pessoal ou
material), buscam dentro da religião (seja ela qual for), uma forma de subjugar o outro e o deixar dependente para que sempre esteja precisando de algo. Dentro das religiões de matrizes africanas isso é mais notório, por conta do longo período de escravidão e por ninguém contestar ou abrir um diálogo com os mais velhos. Todos somos iguais perante a Lei do Santo e a Lei dos homens. Até hoje acho estranho uma zeladora de orixá que quando é recebida uma bênção, a mesma não retribuir, por se achar que ela seja o próprio orixá. Quando tomamos uma bênção, estamos mostrando que temos respeito pela pessoa. Mas, infelizmente certas pessoas se colocam no alto de um pedestal inexistente que me deixa profundamente entristecida.
Verdadeiros zeladores/zeladoras são pessoas que vivem para promover o bem estar de outras pessoas e não para relembrar os tempos de escravidão vergonhosa!!!
Parabéns pela sua matéria.
Mo júbà
Perfeitas suas colocações e somos do mesmo pensamento. Grato pela sua opinião.
O dábò