[Especial] Ògún não é São Jorge. Entenda porque dessa associação.

 Salve Jorge. Salve o Santo Guerreiro.

No dia 23 de Abril se comemora o dia de São Jorge. Às 5:00 da manhã há um ato chamado Alvorada, onde soltam se fogos. Pessoas passam a usar vermelho, cor do martírio do santo. Acende-se vela diante da imagem do santo ou de seu altar. Nas ruas há cavaleiros com seu animais ornados com muito vermelho. É o dia do Santo Guerreiro.

As igrejas dedicadas ao santo chegam-se a criar filas enormes com seus devotos querendo pagar promessas feitas anteriormente, ou aqueles que visam fazer a sua primeira promessa tocando o manto ou a imagem do santo matador de dragões (Mito já superado. O dragão – o demônio – simbolizaria a idolatria destruída com as armas da Fé. Já a donzela que o santo defendeu representaria a província da qual ele extirpou as heresias.).

Mas é um dia que não somente os devotos católicos se dedicam a louvar o santo. Há Candomblecistas e Umbandistas que também se dedicam sua fé neste dia; alguns barracões servem uma farta mesa de café da manhã especial e todo um ritual se segue, como um ato de silêncio que representa uma passagem da vida de Ògún.

A esta mistura de crenças damos o nome de sincretismo, vamos entender isso e porque algumas pessoas não gostam desse sincretismo hoje.

Sincretismo Religioso – Enganando os Senhores de Escravos. Compreenda!

Sincretismo é a reunião de doutrinas diferentes, com a manutenção embora de traços perceptíveis das doutrinas originais. Possui, por vezes, um certo sentido pejorativo na questão da artificialidade da reunião de doutrinas teoricamente incongruentes entre si.[1] Frequentemente, quando se fala em sincretismo, se pensa no sincretismo entre diferentes religiões, no chamado sincretismo religioso. (Wikipedia)

Muito comum assim que qualquer pessoa entra para o Candomblé, principalmente Umbanda, ficar a par do sincretismo que há entre os santos católicos e os orixás (àwon òrìsà). Sabido é que os escravos passavam por um processo de catequização ou cristianização forçada, um processo que chegava a mudar seus nomes através de batismo e adoção de nomes comumente europeus. – Veja nesta Postagem Sobre Mudança de Nome e Cultura!

No processo religioso não era diferente, suas crenças foram proibidas permitindo somente a crença cristã católica. Inteligentemente, no intuito de manter sua fé em seus deuses nativos, os negros escravos começaram a fazer associações para enganar os senhores. Invocavam os orixás, voduns e Nkisis (Inkises) através das imagens dos santos católicos: Oxóssi na forma de São Sebastião, Ogum como São Jorge, Oxalá como Jesus Cristo, Ibejis como Cosme e Damião, Iansã como Santa Bárbara, os fios de contas como Nossa Senhora do Rosário, entre outros(Essa relação depende de localidade, pois mudam).

Esse processo conseguiu manter viva a fé e a força por lutar por dia melhores. Através desse engenhoso meio de culto muitos locais religiosos sincréticos passaram a existir, porém com a faixada de culto a santo católico. O que ocorria ao fundo eram os louvores aos orixás.

Destaque vai para a Irmandade da Boa Morte que sempre manteve estreito laços com os dois lados – Católico e Afro Culto. A reunião de mulheres africanas livres mantinha em seu seio mulheres todas do Candomblé (na época ainda não organizado como é hoje conhecido).

Ògún e São Jorge. Os dois guerreiros louvados no dia 23 de Abril.

Hoje o sincretismo já não é tão bem aceito por algumas pessoas do Candomblé. Isso porque a religião cada vez mais se firma independente, madura e com identidade própria. Não são todos que concordam com a afirmação que Ògún é o mesmo que São Jorge, assim como com outros santos.

O mesmo se diz de muitos católicos, na verdade estes nem fazem essa associação pois estariam adorando um deus de Culto pagão animista, no entanto muitos respeitam ou pelo menos toleram a associação feita entre o santo e o orixá.

Mas porque essa associação entre as figuras religiosas?

Ògún é um orixá destemido, guerreiro, associado a batalhas, guerras, ao bélico, às lutas. Suas lendas sempre falam de superação, liderança e vitória. Ògún inspira força, vitória. Seus iniciados recorrem a ele para vencer batalhas cotidianas, demandas!

Toda pessoa do Candomblé e Umbanda vê em Ògún o perfeito guerreiro, viril e sempre pronto para guerrear saindo vitorioso. A associação com São Jorge é quase automática.

São Jorge em seu Cavalo, armadura e lança nos remete ao combate. No passado São Jorge foi soldado do Exército Romano galgando postos vindo a se tornar oficial. A própria igreja sabe que muito do que é dito sobre sua vida é de difícil verificação de veracidade.

Lembrando que em alguns locais Ògún é sincretizado com Santo Antonio e não São Jorge.

Vermelho é sua cor por causa do martírio. Alguns fazem essa associação de cor também a Ògún, não por martírio mas pelo seu elemento fogo(outros associam o Azul como sua cor). A principal imagem de São Jorge  e de sua vitória é contra o dragão, para poder proteger uma princesa.

Esta clássica imagem é romantizada, emblemática, figurativa. Não houve um dragão em nem uma princesa como dito acima.

Mãe Stella de Oxóssi – “St. Bárbara não é Iansã!”

Como podemos ver, a associação é bem fácil. Mas como diz a Ìyálórìsà  Stella de Osoosi (Mãe Stella de Oxóssi) quando disse a célebre frase que St Bárbara não é Iansã :

“Os Santos e imagens católicos têm seus valores. Nós não estamos a fim de deixar de acreditar, por exemplo, em Santa Bárbara. Um espírito elevado, sem dúvida. Mas sabemos que Iansã é uma outra energia, não é Sta. Bárbara. Religião não se impõe, depende da consciência de cada um. Mas queremos respeito com o Candomblé. Não tem nada a ver, por exemplo, arriar-se comida de Iansã nos pés da imagem de Sta. Bárbara. Não tem sentido. A comida é de Iansã, é outra energia, completamente diferente do que é Sta. Bárbara, entende?”

Ou seja, são energias diferente. Ògún tem sua natureza de energia espiritual totalmente diferente da natureza de São Jorge. E o mais interessante é que é fácil o Candomblé absorver as crenças católicas, mas o oposto não o é. Não é uma relação bilateral de associação. Veja abaixo o pensamento de um católico sobre esse sincretismo:

O que importa é a fé!

Ao final de tudo, acredito que o que importa mesmo é a fé, pois não creio que a energia fica se auto intitulando e tenha esse senso de pertencimento. Não consigo conceber o sagrado envolvido em discussões religiosas, pois a instituição religião e toda sua contenda é criação do homem.

O homem que intitulou, encapsulou mentalmente as energias espirituais dando-lhes lugares, nomes e enfim, uma instituição religiosa. Claro que em matéria de religião cada qual tem suas diretrizes e características, assim o homem a concebeu, mas não há nada que impeça um iniciado ao Candomblé devotar um pouco de sua fé a São Jorge e um católico ao ver Ògún dançando lançar seus pedidos a ele para vencer uma batalha da vida.

O que podemos concluir é que hoje as religiões querem seu lugar próprio pois não há mais necessidade de se esconder. Mas sabemos que alguns hábitos e culturas se enraizaram, ficando difícil fazer a separação. No entanto que todos saibam que Ògún é um deus originário da África. É um orixá guerreiro e tem seu culto no Brasil mantido dentro do Candomblé e de certa forma na Umbanda, tendo comidas, cantos, rezas e liturgias próprias! Ele é cultuado em toda casa de Candomblé.

São Jorge é um santo cultuado pela igreja católica, também é um guerreiro, mas segundo os preceitos da Igreja Católica, não precisa de oferendas, comidas para ser cultuado. Para ele há orações, novenas e outras formas de devoção. Possui igrejas próprias.

Cada qual em seu lugar!

Ó dàbò!

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Comments
  1. Robson Brante
    • Olùkó Vander
  2. crisburok
  3. jaqueline
    • Olùkó Vander
  4. jaqueline
  5. Caroline Urpia
  6. Isa
    • Olùkó Vander
    • Beatriz Amorim Silva